Tag: análise

  • Two Falls - colonização, povos originários e certezas

    Two Falls – colonização, povos originários e certezas

    Two Falls (Nishu Takuatshina) é uma aventura narrativa em primeira pessoa que retrata os primeiros encontros dos franceses e os povos originários do Canadá. O game apresenta perspectivas diferentes ao nos colocar de forma alternada nos papeis da francesa Jeanne e do caçador Innu Maikan no século 17.

    Ao exploramos a natureza selvagem canadense temos a sensação de que para aprendermos a lidar com situações novas talvez seja necessário questionarmos nossas certezas.

    A desenvolvedora Unreliable Narrators traz o drama de Two Falls para o PC via Steam e Epic Games e promete lançar o game para Playstation 5 e Xbox Series X/S no começo de 2025.

    Two-Falls-Jeanne-Pierre Two Falls - colonização, povos originários e certezas

    Foco na narrativa

    Two Falls é um desses games focados em narrativa, linear e com a tradicional gameplay dos “simuladores de caminhada”. Não há combates ou árvores de habilidades aqui. Por outro lado, as nossas escolhas afetam as personalidades dos protagonistas e como os demais personagens dessa história reagem a eles.

    O game mostra na interface como nossa decisão impactou o personagem, assim que a cena segue. Mas em alguns momentos ele faz piada com a situação e e uma ocasião me fez rir.

    Logo no inicio do game Maikan encontra um rosário, que não significa absolutamente nada para ele. Mas eu escolhi a opção em que ele guarda o item, e o personagem responde a esta escolha com uma fala mais ou menos assim: “Não sei o porquê guardei isso comigo. Talvez eu esteja cansado de ver coisas abandonadas para apodrecer.”

    Para quem gosta de boas narrativas, Two Falls é um prato cheio e de alguma forma raro. O game entretêm mas vai além disso, mostra um pouco da cultura, das tradições e conflitos dos povos que participaram da criação do que conhecemos hoje como uma parte do Canadá.

    A minha sensação é que o jogo anexa a ele um lance meio documentário, que de alguma forma me lembrou o excelente “Never Alone” de 2015 e os povos originários do Alaska.

    Respeito

    O que me impressionou no game é a qualidade da narrativa e, em especial, o respeito com que ela foi feita. E isso deve ser consequência da colaboração de mentes indígenas no desenvolvimento do game. E da consultoria dada pelo conselho dos povos originários. Porque vejo o reflexo desses pontos no cuidado em que as informações e tradições são apresentadas ao jogador.

    Um bom exemplo disso é o codex do game que funciona como uma espécie de compêndio de informações relevantes. E é legal porque cada protagonista tem o seu codex. Nele não só encontramos como um item é visto na perspectiva de Jeanne ou Maikan, mas também temos uma informação real / histórica sobre aquele item.

    Two-Falls-codex-Jeanne Two Falls - colonização, povos originários e certezas
    Two Falls (Nishu Takuatshina) codex

    Além do codex a própria narrativa traz informações relevantes sobre as tradições do povos originários. Especialmente através de Maikan, que com frequência menciona os ensinamentos de seu “bisavô”. Que é como ele se refere a figura do ancião de sua comunidade, um dos grandes responsáveis por manter as tradições e ensinamentos vivos entre as gerações.

    Há sempre algo mais

    Claro que há informações históricas interessantes sobre Jeanne, a francesa que cruza o Oceano para tentar a vida na colônia. E ao contrário do que eu imaginava, ela não é só mais uma europeia com a mente colonialista.

    Uma parte importante da sua história me deixou desarmado logo no inicio do jogo e me fez perceber que Two Falls não é uma história sobre bandidos e mocinhos. E isso se confirma ao longo de toda a jornada, não só pelos protagonistas mas também por outros personagens que encontramos pela jornada.

    Apesar de tratar de um recorte do século XVII, os personagens enfrentem dilemas palpáveis e isso ajudou a me identificar com as suas dificuldades. Em determinado momento Maikan vive o conflito entre o ensinamento de seu povo que prega o perdão e a dificuldade de fazer isso vendo todos problemas que o homem branco trouxe com ele.

    O que é a verdade?

    Gostei muito de ver como os personagens são obrigados a questionar suas próprias convicções durante seu desenvolvimento. Até mesmo nós jogadores somos obrigados a repensar algumas posições quando o game retrata um mesmo evento por diferentes perspectivas.

    Por falar em perspectivas diferentes, Two Falls reforça a ideia de um outro ponto vista ao adotar direção musical e de arte diferentes para cada protagonista. Um exemplo disso é a area litorânea logo no inicio do jogo que ganha detalhes e iluminação bem diferentes dependendo do contexto e de quem protagoniza a cena.

    O game utiliza Unreal Engine 5 e os gráficos estilizados são bons e alguns cenários são muito bonitos. O áudio funciona bem e a trilha sonora traz um contraste interessantes com musicas que me remeteram à natureza e ou xamanismo e as mais tradicionais musicas europeias que de alguma forma já se tornaram comuns pra mim.

    Two-Falls-dark-forest Two Falls - colonização, povos originários e certezas
    Two Falls (Nishu Takuatshina) floresta

    Bug pré lançamento

    Eu tive alguns probleminhas de desempenho pré lançamento. Em uma ocasião a personagem sentou e ficou parada ali após a cut scene, não consegui me movimentar e tive que reiniciar do ultimo check point. E em duas outras ocasiões o game apresentou erro e fechou de vez. Em todos os casos voltei do ultimo ponto de salvamento e segui a jornada.

    Claro que para um jogo narrativo a qualidade do texto é o mais importante e felizmente Two Falls não decepciona. O texto é muito bom e me prendeu por toda a narrativa. Isso sem falar em todas as informações extras disponíveis no codex, que não são necessárias para o desenrolar da história mas ajudam a contextualizar e refletir sobre os desafios das personagens.

    A dublagem é excelente, eu joguei em inglês e o trabalho dos atores aqui é muito bom. O jogo também possui audio em Francês, mas meu conhecimento neste idioma é limitado então decidi ficar com o tradicional mesmo. Infelizmente Two Falls não foi localizado para português brasileiro. Aliás, até o momento o game está disponível apenas em Inglês e Francês.

    Vale a pena?

    Em sua comunicação o game usa a frase “Não existe verdade. Existe apenas percepção.” e este é um ótimo resumo do que mais me marcou nas minhas agradáveis 6hs com a campanha de Two Falls.

    Os desenvolvedores não me pareceram preocupados em entregar uma forma unívoca de ver o problemático período de colonização. Mas sim em apresentar a pluralidade de perspectivas e um pouco dos componentes que fizeram parte daquele período. Desta forma, podemos tirar conclusões por nós mesmos. E pra mim, este é o ponto mais alto do game e por isso o recomendo.

    Eu fiz esta análise de Two Falls (Nishu Takuatshina) com uma cópia de avaliação que recebi dos desenvolvedores. Agradeço a eles por confiarem em nosso trabalho.

  • Sugar Mess e seu ritmo doce

    Sugar Mess e seu ritmo doce

    Tentar definir este jogo é difícil porque a “bagunça” parece não estar no titulo a toa. O game mistura diferentes estilos de jogo num pacote acessível, com ritmo agradável e que acaba de receber um update significativo. A atualização Pesadelo de Sugar Mess chega o Playstation VR 2 e traz novas fases, novas mecânicas e inimigos mais poderosos. O que posso garantir é que o game se aventura por diversos estilos de gameplay e o faz bem. E como o game é curto a gente fica com o gostinho de quero mais.

    Em um primeiro momento eu definiria Sugar Mess como um shooter sobre trilhos ou um wave shooter, mas essa definição seria precipitada já que o game tem fases musicais em que é preciso tocar instrumentos ou dançar, além de quebra cabeças. Então na real, o melhor é não tentar definir uma categoria aqui porque na minha opinião esta combinação de diversos estilos de gameplay é exatamente o ponto alto do game. Sugar Mess chega ao Playstation VR 2 e tem também uma demo gratuita disponível na ps store. O game também está disponível nas lojas de realidade virtual Pico, Meta Quest e logo chegará a Steam.

    Após um breve tutorial, nos encontramos num sótão que serve como nossa base. Nele há um fliperama (arcade) onde podemos adquirir armas novas (são três no total) e jogar um mini game. Além disso, há uma mesa com um tabuleiro muito legal e o “pino” do Príncipe do Açúcar, o protagonista da campanha. É movendo esse pino no tabuleiro que escolhemos a fase que iremos jogar. Ao chegarmos a uma fase nova o tabuleiro dá lugar a um livro colorido com belas ilustrações que saltam de suas páginas e que ajudam a contar a história do jogo.

    O príncipe de açúcar e os robôs

    A gente começa a campanha com a gameplay clássica de um wave shooter, parado em um ponto enquanto os inimigos avançam sobre nós. Na fase seguinte estamos num carrinho sobre trilhos e atravessamos o mapa detonando os inimigos que aparecem pelo caminho até chegarmos a próxima fase em que temos que resolver um quebra cabeças para abrir um portão.

    Esse esquema segue até o fim da campanha e confesso que gostei disso. Intercalar estilos de gameplay em cada fase deixa o game longe da monotonia e cheio de surpresas. Como por exemplo, as fases em que o jogo usa mecânicas de jogos de ritmo / música, como tocar “tambores” numa trilha musical a lá guitar hero ou entrar no ritmo da música dançando usando orbes como em Synth Raiders.

    Visual, áudio e localização

    Na parte visual o jogo é bem colorido com uma pegada infantil e no geral os gráficos simples estão nítidos no PSVR2. A desenvolvedora JollyCo usou novas versões dos mesmos mapas da campanha no conteúdo da atualização Pesadelo, mas não achei que comprometeu o game.

    A trilha sonora é agradável e o game está localizado em português (tenho quase certeza de que é Português de Portugal). Infelizmente os desenvolvedores não dublaram o game nem em Inglês. E como conhecemos a campanha do game por um livro infantil de histórias eu gostaria de ter ouvido a narrativa na voz um narrador.

    Vale a pena?

    Sugar Mess acabou e ai? Com seu ritmo doce e desafio moderado é recomendação certa para crianças. Também recomendo para os adultos que estão começando na realidade virtual. Com uma boa e gostosa mistura de mecânicas já consagradas em outros títulos famosos, este me parece um excelente pacote de introdução a VR.

    Se você é veterano de realidade virtual eu recomendo cautela. A JollyCo executou bem as diferentes mecânicas no game. Mas, a campanha é curta, o desafio moderado e infelizmente não há possibilidade de alterar o nível de dificuldade. Por isso, é bom dosar as expectativas para não se frustrar.

    [editado após publicação da análise]: Sugar Mess recebeu um novo update que adiciona a possibilidade de alterar o nível de dificuldade, uma vinheta para maior conforto e acessibilidade e os controles de áudio para configurar trilha sonora e efeitos separadamente.

    Agradecemos aos desenvolvedores pelo envio da cópia digital do game para análise do jogo ( review ).