Imagine acordar em belas e estranhas terras desconhecidas no corpo de um misterioso pássaro artificial. Pouco depois, encontrar uma inesperada companhia para ajudar a explorar o território desconhecido, resolver enigmas e testemunhar o desenrolar de sua aventura. Mare chega ao PSVR2 e nesta análise vamos conferir como a desenvolvedora Lonekite Games se saiu ao trazer o jogo para o playstation 5.
Existem dois modos de jogo, escolhi o que utilizamos os controles de movimento do PSVR2. No outro jogamos apenas com o rastreamento ocular. A ideia me pareceu interessante, mas torna a experiência mais simples e com menos puzzles, dada as limitações de interações com os nossos olhos.
Logo ao começar me encontro no céu em meio a nuvens e balões com o que parecem ser bombas. O jogo é na terceira pessoa, eu vejo o pássaro misterioso que incorporei há pouco. No céu ele usa uma espécie de suporte sustentado por uma pipa para pousar e neste ponto tenho total liberdade para olhar para onde desejar.
Ainda no céu preciso agir e a forma de interagir com o cenário é pressionar o gatilho para que o pássaro emita eletricidade em pontos específicos. Após libertar pequenos ajudantes de uma espécie de gaiolas começo a atacar os balões para destruir suas bombas.
A parte boa aqui é que a qualidade visual do game fica evidente. Os gráficos estilizados estão nítidos no Playstation VR 2. A renderização ocular dinâmica aqui é usada e ajuda garantir que o jogo rode a 90fps nativos.
Há um ultimo balão vermelho e maior que os demais no céu. Ele parece carregar uma bomba ainda maior. Eu o ataco mas não tenho sucesso e ele começa a descer. Tento trocar de posição mas o local em que eu pousaria é destruído por raios e por isso começo também minha descida.
Após cruzar as nuvens e já ao nível do mar em meio a uma tempestade me encontro novamente com o balão vermelho. Eu ataco novamente e desta vez consigo causar dano enquanto penso “preciso evitar que ele solte essa bomba”.
Pouco depois um raio da tempestade me acerta e caio no mar com o corpo em chamas. Acordo em uma ilhota no litoral, ao me locomover encontro o balão vermelho caído e para minha surpresa a bomba está largada no chão.
Estou na orla da praia de frente para o construções de uma civilização que desconheço. Não consigo avançar e volto minha atenção para o que eu julgava ser uma bomba. Ao interagir com ela encontro uma menina de uns 4 ou 5 anos dentro da cápsula que pede minha ajuda em português.
Sem spoilers
Essa é a enigmática introdução de Mare que me deixou super curioso para explorar o game e tentar juntas a peças deste quebra cabeças. Mas vou parar por aqui pra evitar spoilers sobre toda a campanha.
A minha primeira impressão do game, ainda no céu, foi que ele trazia uma singularidade que me lembrou Paper Beasts. Formas conhecidas, em outros materiais num universos com leis próprias.
Mas bastou o contato com a garotinha e iniciar a exploração da ruínas que notamos as influências da Team Ico e Fumito Ueda. A atmosfera e o universo criado de alguma forma remetem aos clássicos Ico, Shadow of the Colossus e The Last Guardian.
Lembra da demo do The Last Guardian em VR para o ps4? O sistema de movimentação aqui é bem parecido. Miramos em pontos específicos do cenário e acionamos o gatilho para que uma animação nos leve até lá.
Ao contrário do The Last Guardian, aqui estamos na pele de um “animal” e devemos conduzir o humano pelos belos e intrigantes cenários de uma civilização antiga.
Acionando o gatilho liberamos eletricidade para colocar equipamentos em movimento, indicar onde a garotinha deve ir e eventualmente abrir portas ou acionar sistemas para que a nossa jornada siga.
Bom uso do PSVR2
O feedback tátil no PSVR2 é muito bem utilizado pela desenvolvedora Lonekite. Sentimos a vibração na cabeça quando cruzamos a tempestade no inicio da jornada. E os gatilhos adaptáveis funcionam muito bem. Dosar a intensidade ao liberar energia elétrica para diferentes objetivos no jogo é um bom exemplo.
A trilha sonora e efeitos são bons. Gosta da música calma com tom sobrenatural que se enquadra muito bem a atmosfera de Mare. Nem o fato da menininha ter um repertório limitado me incomodou, já que condiz com o comportamento de crianças da mesma idade.
Aliás, o fato da personagem falar português me surpreendeu porque achei espantoso um game em VR ser dublado em nosso idioma, já que a maioria nem legenda recebe. Só depois confirmei que o áudio dela não muda em outros países. E acho que a ideia de não compreender o que ela fala deve se conectar de alguma forma com essa aura misteriosa do game.
Eu levei por volta de 3hs para terminar a campanha, segui meu ritmo aproveitando e admirando a beleza, a atmosfera e a imersão naquele universo.
Depois de concluir a campanha decidi voltar para os colecionáveis que me faltaram. Após completar a coleção é possível desbloquear um outro final. Na minha opinião ainda melhor que o anterior, então o esforço vale a pena.
Mare é uma dessas obras artísticas que não nos dá o significado das coisas o tempo todo. Ela deixa margem para a interpretação de seu interlocutor. Excluindo as expressões da garotinha, toda a narrativa é contada sem uma única palavra. E por isso boa parte da interpretação é muito pessoal.
Para dar um exemplo eu passei a parte inicial do jogo tentando destruir uma bomba no balão vermelho. Mas pouco tempo depois descobri que na verdade era a criança que se tornou minha companheira de aventura.
No geral eu gosto do jogo não te dizer o que fazer e deixar que aquele mundo fale por si mesmo. Mas isso pode gerar alguma frustração porque durante o episódio final eu não sabia que era possível usar o teleporte com o joystick.
A mecânica nova foi inserida sem nenhum aviso e quando descobri que era possível eu já estava lidando com a frustração. Uma simples animação discreta mostrando o controle no início daquela parte teria evitado o problema.
Outro ponto que poderia melhorar é a ausência de elementos para aumentar a conexão com a nossa companheira de aventura. Não podemos acenar, fazer um cafuné ou interagir com ela como é possível em games como Moss, Astrobot ou Ghost Giant. Toda nossa interação se dá por comandos e essa foi uma oportunidade perdida.
Vale a pena?
Sim! eu recomendo. Mare é um puzzle game de aventura num universo belíssimo e intrigante. E o fato dele não fechar o sentido de tudo o que apresenta, certamente vai colocar a sua cabeça pra imaginar e preencher as lacunas dessa narrativa.
A qualidade visual e seus controles simples fizeram com que eu me sentisse completamente imerso naquele mundo e não visse o tempo passar. O jogo tem um ritmo quase contemplativo, o que do meu ponto vista se adequa muito bem a proposta.
Eu gosto muito quando jogos com propostas diferentes aparecem na biblioteca do PSVR2. Mas reconheço que ele não tem apelo universal, por isso é bom dosar sua expectativa. Eu não o recomendaria pra quem busca adrenalina ou não consegue lidar com ambiguidade.
Mare tem esse lance meio artístico e suponho que daqui um tempo se torne algo “cult”. Não me interpretem mal, eu gosto de Resident Evil, Metro Awakening e Synapse. Só acho que a mídia é boa e complexa o bastante e seria um desperdício não explorarmos outras possibilidades. Que bom que Mare chegou!
Eu analisei Mare no Playstation VR 2 com um cópia de avaliação gentilmente cedida pelo estúdio Lonekite Games. Agradeço pela confiança em nosso trabalho.